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sábado, 23 de fevereiro de 2013

No Cemiterio


Colecção : Textos e pretextos

                  No Cemitério                                      

Há gente que vai ao cemitério em busca de refrigério.

Pura ilusão.

Aquele ser querido que ali depositámos. Já lá não está.

Habita outra região.

Sim . O corpo é pó. Desfaz-se. Desaparece.

A alma. O espírito, esse não.

Vendo uma senhora chorar desesperada. Sentidamente.

Aproximei-me.
Perguntei : - por que chora tanto, minha amiga? Fale-me. Diga.

- Morreu meu marido…

 - E ele era bom? Era seu amigo?

-Muito! Era amigo de toda a gente.

- Que bom. Não pode ficar indiferente.

Mas antes de tudo, agradeça..

 Tem que tirar isso da cabeça.

Isso é o que mais ajuda uma viúva, irmã.

-Acredita em Deus?

-Muito!

-Querida, aprendemos que a dor é  normal. É mais fácil aceitar, senão a nossa fé é vã.

Falar com ele. Orar… Vai ajudar.

-É verdade, mas quando venho ao cemitério fico pior.

-Se ele era seu amigo não a quer triste. Não vir será melhor.

Tudo que nasce morre. A senhora e eu também…

- Minha amiga, tem razão. Vivemos todos em ilusão.

- Há uma certeza: o espírito não acaba. Encontrar-nos-emos no Além!

Cremos na Ressurreição.

Um dia a saudade, tornar-se-á eternidade.

A tristeza deste dia, vestir-se-á de luz. Paz e Alegria!

 E a senhora afastou-se naquela manhã fria.

No seu rosto em lágrimas, agora um raio de esperança brilhava.

 O dia crescia lentamente...

 A vida tímida e escorregadia simplesmente  avançava.
 Não parava.
Indiferente a tudo e a todos, não querendo saber de nada.
 
                                                            23.2.13 ...LUCINDA FERREIRA
 

 

 

 

 

 

 

sábado, 9 de fevereiro de 2013


Colecção :                      Textos e pretextos.

 

                                          O NEGRINHO

O NEGRINHO que mora na Favela desce todos os dias até ao jar-

dim.

Fica longe das pessoas. Olhando. Cantando. Sempre no plano sobranceiro.

É pobre. Envergonhado. Negro e…sem dinheiro.

Traz o cãozinho seu amigo .Brinca com ele . Fala alto.

 Está sempre sózinho….

 

Em baixo, os casais , as amigas, os mais velhos, as mocinhas, as “donas” com os cachorrinhos, caminham apressados na sua marcha matinal. Habitual.

 

E o Negrinho continua a falar sozinho.

A brincar com o cãozinho que o ama sem reservas. De verdade.

 Na sua pureza animal. Isento de maldade...

 

E o pessoal indiferente continua a caminhar.

A conversar…

A ouvir música.

E o Negrinho a cantar.

 

Um mundo em compartimentos.

 

A vida lá por cima a observar.

A sorrir , umas vezes.

Outras, a chorar.

 

De repente, o caminhante pisa em falso. Tropeça. Cai no ca-minho!

Ligeiro desce a escada correndo. Apressado.

Vem o Negrinho.

(A arfar segue-o aflito o seu amigo, o cãozinho.)

 

Levanta de imediato o Senhor com carinho.

 Com todo o cuidado...

 

Não sei se o Senhor o olhou a direito.

Também não sei se agradeceu.

Continuou a caminhar. Devagar. A coxear.

 

Será que ficou magoado ou envergonhado?...

 

Fez-me pensar.

 

                          Praça Juscelino Kubitchek, BH, 12.1.13
lucinda ferreira