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segunda-feira, 7 de maio de 2018

Carta a uma Amiga!

Textos e pretextos
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Carta a uma amiga…
Aquele que conhece a arte de viver consigo próprio ignora o aborrecimento. IsErasmo




Querida Solidão:
Quando todos nos abandonam, tu és a fiel e presente amiga, que nunca desapontas. És sólida e igual a ti. Não enganas ninguém.

Sabes quanto se chora às escondidas, por abandono e tristeza, dos que professam a mesma Fé. Dos que se favorecem em situações diversas, e que perdem a memória dos afectos e do reconhecimento carinhoso.

Ajuda-se o outro/a com todo o coração, com genuíno amor e espontaneidade, mas a gratidão não é cultivada. Até deixam de conhecer quem lhes perfumou a vida. Usam e abusam da credulidade. Pureza. Disponibilidade. Desinteressadamente a Solidão, essa é segura. Todos se escondem na poeira do tempo.

Enfeitam-se as pessoas com as nossas projecções, o que nada tem a ver com elas, daí que a Solidão tem sempre razão.

- Sabes hoje, o quanto és importante para mim. Quanto te amo. Venero!

Quando Anne Frank dizia que somos terrivelmente sós , quando não somos particularmente importantes para alguém, eu ainda não sabia, como é gostoso  conviver ‘eu com eu’. 

É muito melhor do que viver com alguém, e estar ainda mais só!

Aliás, entrar em contacto connosco, só traz benefícios.
Segredas isto e muito mais ao ouvido, mas dificilmente te aceitam.

Batalhamos pelos que amamos e nesse gesto já temos todo o retorno da alegria do bem-fazer.

 Deserto é sempre deserto, onde nem um olhar ou um abraço têm cabimento, mas o tempo flui.
 É professor. Acaba por se descobrir o encanto e ternura de uma flor abrindo. Da carícia de um animal. Do som da Harpa quando o vento bate na janela do quarto.

Depois de muito lutar, venceste, querida Solidão!

Hoje, como te busco. Prefiro a tanta hipocrisia. Barulho. Confusão. Aparências e mentiras, já não preciso de te dizer.

Muita gente pensa que a produtividade, a alegria, a criação artística e não só, nascem no obrigatoriamente sociável.

Não sabem eles, que a Solidão é tão necessária como o ar que respiram, para que esses estados de espírito aconteçam e a luz possa brilhar no fundo do ser.

Todas as mentes mais brilhantes escolhem a Solidão!

Concordamos que as longas conversas são entediantes.
Para não quebrar a dinâmica do grupo, ter que suportar as crenças do grupo, é duro. Silenciar o pensamento próprio e original, para ser aceite, custa.

A sociedade ocidental que privilegia a pessoa activa à contemplativa, insiste no trabalho de equipa, desprezando a contemplação e autoconhecimento.

 A percentagem de infelicidade e descontentamento está em tudo isso. Se não és sociável (?!), até vêm com a história triste do psiquiatra, que entorpece com drogas cheia de efeitos secundários, de um qualquer laboratório amigo.

Mas casar mais tarde, a grande percentagem de divórcios, a longevidade, incentivam à Solidão voluntária, muitas vezes, até como um luxo.

Andar pela casa à vontade, mudar de canal da TV sem teres de negociar, comeres apenas quando te apetece, saíres e demorares o que precisares, cair na cama sem ninguém que ressone ou te incomode, dormir no sofá, improvisar planos sem explicações complicadas, viver relações com mais qualidade, não por imposição, mas por extrema satisfação, sem apego e verdadeiro amor, tudo isso a Solidão oferece.

Facilita ainda,  o desenvolvimento da empatia, numa extensa rede social. A bondade genuína sem constrangimentos. A aceitação. A valorização e estima do outro, sem interesses e egoísmos camuflados e muita raiva, revolta à mistura.

É no deserto onde se pode ser totalmente livre. Sem medos, reencontra-se o indivíduo inteiro.

E em paz consigo mesmo. Isso é saudável e reparador.

Sabes, querida Solidão, as pessoas fogem do seu interior. Não querem mudar, por isso nem sequer contemplá-lo, lhes apraz. Não querem saber quem são. Vivem na ilusão. De aparências. Nas competições. Acham se uns lírios. Nunca assumem responsabilidades. Culpam tudo e todos pelas suas dores e contratempos.

Quanto menos estão sós, mais difícil é ficarem sós.
 Dizem:

 - Interioridade é lá para os orientais. Meditação. Oração. Perdão é para “beatas” e para a  Seicho-no-Ie


Responde serena a Solidão:
- Todos acabam por vir bater à minha porta. Nasces sozinho e morres sozinho. Ninguém pode fazer essas coisas por ti, mesmo que estejas sempre muito acompanhada e no “laró”.

- Sabes, querida Solidão, sinto-me mal no barulho.

O espaço solidão é um bálsamo para fazer contacto consigo mesmo. É nessa contracção que se recupera o equilíbrio. Se for na Natureza, o prazer redobra. Recuperar a necessidade contemplativa é imprescindível, para compensar a hiperactividade destrutiva, que grassa na alienação geral!

- Somente quando se tolera o tédio e o vácuo, se é capaz de desenvolver algo de novo. Desintoxicar de um mundo compulsivo, cheio de estímulos e comandos, que constantemente tiram a pessoa do seu eixo. Uma sobrecarga informativa carrega em si muito lixo.

As crianças são as grandes vítimas. Os pais alucinados. Irresponsáveis, deixam nos entregues aos i pad’s, televisões, telefones, cheios de radiações perigosíssimas, em vez de brincarem com eles, em casa ou na Natureza. Não sabem estar sós. Tranquilos.
)
As crianças super activas e destrambelhadas com tanta violência veiculada, sem discussão e análise, com os pais, acabam, elas também, na violência. Crime e comportamentos desviantes.
(Eduquem as crianças, para que não seja necessário punir os adultos. Pitágoras)

A base da criatividade. Inovação e liderança assentam na solidão.

Depois de um dia stressante no serviço. Redes sociais. Telefones, só a Solidão oferece o repouso capaz de curar.
É de extrema urgência criar oásis de silêncio. Isolamento e fazer as pazes consigo. 
 Minha amiga querida Solidão, amo-te.
Sou - te grata por tanto que me tens dado.
 Peço perdão por nem sempre ter sido assim o nosso relacionamento, pois hoje sei que…
"A solidão é a sorte de todos os espíritos excepcionais". Arthur Schopenhauer


 Coimbra , 7 de Maio de 2018 
Lucinda Ferreira